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A Enfermagem e Eu Part. 2

Atualizado: 4 de out. de 2019



Prestei vestibular para medicina, não passei, fui reprovado em todos, eu pedia isenção para não pagar as taxas, mas ao menos tentava, porque era isso que estava na minha cabeça, tive a oportunidade de passar com a psicologa profissional e ela tbm afirmava que minha área de atuação era na área da saúde, talvez porque eu era incisiva no que eu queria.E se eu puder dar uma dica, acho que tod@s deveriam ter uma psicologa que atue com orientação vocacional, muito importante e acho que ajuda muito.


Em 2004 após todos os resultados do vestibular, o único resultado que eu tinha notas muito boa eram as notas do ENEM e neste ano iniciou as inscrições do PROUNI, o que significava que deveriamos concorrer a vagas para instituições privadas para cursarmos. Este ano, foi o ano que o meu irmão Renan também estava prestando vestibular, como eu dediquei 1 ano ao cursinho, ele me alcançou e estavamos juntos na saga de vestibulando. Eu tinha a vontade de morar em república, sair de casa e curtir a vida de universitária, obviamente, eu não fazia ideia dos custos que seria isso. Na hora de escolher o curso e universidade, eu escolhi enfermagem e na Faculdade de Medicina do ABC, minha primeira opção, como uma boa virginiana que sou eu tinha que fazer escolhas mais racionais. Ainda não sabia onde estava me mentendo. Renan com a dúvida entre Turismo, Teologia e Educação Física, optou por Educação Física ( a profissão de papai), alguém tinha que ir pra área da educação.


Passamos, família feliz, eu ainda não sabia se estava feliz ou triste... mas todos estavam muito mais felizes do que eu. Comecei a aceitar e ouvir as diversas frases: “ - fazer Enfermagem sem antes fazer o técnio.” “Você não queria fazer medicina?”... Eram muitas explicações, mas em nenhum momento revogada pelos meus pais, eles estavam felizes, eu estava na universidade, uma das melhores de São Paulo e do Brasil, o curso que eu tinha escolhido era reconhecido e muito bem visto. Mas eram dúvidas que pairavam, mas segui...


Em uma viagem ao Rio de Janeiro para o casamento de uma amiga, a Ananda, em um programa de televisão, ao conhecer sua tia que era médica, ao avisarem que eu passei na faculdade de medicina ela me disse: “Que legal! Os enfermeiros são ótimos professores.” Era tudo o que eu menos queria ouvir.


No primeiro dia de aula oficial, na aula de história da Enfermagem, tivemos a distribuição de seminários, ou seja, eu tinha que organizar um seminário com meu grupo falando sobre São Camilo de Lelles, não sou religiosa, mas queria uma apresentação lúdica e que saísse de todas as formalidades de um seminário nada interativo. Estudamos, pesquisamos, de igrejas, universidades e locais que referenciam São Camilo, fizemos vídeos (naquela época nem instagram tinha ou youtube, mas queria mostrar todos os passos da busca), na aula, me lembro fazendo tipo um show class, tirava baralho do bolso. Ao termino da aula, a professora dizia: “uma ótima professora!”. Eu não queria ouvir aquilo, me matriculei para a enfermagem e não para ser professora.


Eu tinha alguns colegas frustados com a profissão, outros que pareciam amar, outras perdida no curso sem entender ao certo o que fazia um(a) enfermeira. Com o passar do tempo eu via que não tinha muitas habilidades técnicas, mas eu era uma boa gestora, eu me via organizando, planejando. Não me via trabalhando em pronto socorro, na emergência, na UTI. Ahhh queria me matar era pedir pra eu ir lá, eu tinha medo de sangue. Queria trabalhar com crianças, são alegres, tem energia para dar e vender, são expertas.... Até perceber que eu não tenho habilidades para trabalhar com crianças doentes, é dolorido, precisa de no mínimo muita força para suportar tamanha dor.




Quando eu queria brincar com as crianças elas me tacavam brinquedos na cabeça, aliás eu agora era a ENFERMEIRA, aquela pessoa que as mães ou os pais usam como forma de ameaça - “Se você não se comportar eu vou chamar a Enfermeira para te dar injeção.” Hey espera, eu não vou dar injecção em ninguém sem necessidade, eu nunca te darei injeção como forma de punição, tudo será feito para o seu bem! Era tarde de mais pra mudar o pensamento de um mundo....


Fui da liga de pediatria, onde reforçava que eu não queria a minha tão sonhada pediatria. Eu queria trabalhar com algo que fosse além da doença, aliás eu escolhi a área da Saúde e não da doença. Neonatologia também não gostava, eu gosto de crianças falantes e brincantes.


Comecei a ver a Enfermagem como uma área revolucionária e muito bem cogitada pelo meus colegas das ciências sociais. A gente tinha poder de mudar o mundo enquanto enfermeira. Eu percebia que SER ENFERMEIRA era algo além da doença, era prevenir, era gerir era ter uma visão ampla do ser humano. Me recordo na UTI, o paciente tinha tido uma morte cerebral e eu estava no time do cuidado, eu me lembro que eu falava com ele, e as pessoas diziam, ele não escuta, pare de falar com ele. Para mim é o normal explicar o que eu tinha que fazer, independente, quem sabe ele se recupere? Lembro de dar a notícia à família, eu chorava mais que a família, como se fosse uma amiga próximo.


Eu não me questionava e nunca me questionei sobre ter feito a escolha da carreira errada e nem meus professores diziam isso, aliás, uma disse que achava que talvez eu não levava jeito para algumas atividades na enfermagem, ela estava certa, hoje eu tenho a atual certeza de que eu não sou enfermeira de urgência e emergência, não sei atuar em UTI. Aliás ninguém é bom em tudo.


Tive inspirações na minha jornada, as disciplinas de saúde coletiva, os professores que eram formados em Ciências Sociais também me estigavam no debate social e no amplo debate da saúde coletiva. Eu amo a saúde coletiva, o contexto social que leva ao bem estar físico, psico e social além da teoria. Eu queria ir pra pratica, mostra potência e fazer valer tudo que eles explicavam filosoficamente. Meus amigos odiavam isso, eu sinceramente AMAVA, e cada dia me estigava mais aquelas aulas mesmo elas sendo poucas ou tempo limitado. Eu gostava também das aulas de administração de enfermagem, psiquiatria, eram aulas que traziam debates e não técnicas.




Entrei em um grupo de iniciação científica sobre prevenção de HIV e AIDS em comunidades negras, o que foi fantástico, aprendi muito e me fez amar muito mais a enfermagem e a pesquisa. Eu me via como pesquisadora e obviamente como professora, esse adjetivo me acompanhava e eu já não tinha tanto repúdio, eu aceitava, começava a gostar. Fiquei coisa de 2 anos nesse projeto e aperfeiçoando meu conhecimento com HIV, assim como tendo interesse pela área de HIV/AIDS.


Na graduação a pergunta: o que você quer ser quando crescer ainda rondava, e agora era: “No que você vai se especializar?”. Pra ser sincera eu queria trabalhar e ganhar bem, não era mal algum, sabia meus odios e amores e comecei a ir por exclusão e obviamente meu amor era por uma área que tivesse promoção da Saúde e isso me interessava, taí, eu queria fazer Saúde da Família, trabalharia com prevenção, estaria com a comunidade e daria apoio na gestão para que mudanças fossem promovidas assim como melhoria na qualidade de vida de uma comunidade, os meus olhos enchiam de orgulho ao dizer isso. A estudante sonhadora, eu SOU!!! Sempre sonhadora.


Enfermeira de saúde da família, em 2009 tinha muitas vagas e o governo pagava muito bem e eu me sentia apta para essa função e qualificada para isso. Abriu um concurso de Enfermeira Saúde da Família para uma OS, mas infelizmente os requisitos de experiencia eu não me enquadrava, eu sempre fui muito certinha, eles talvez não iam investigar se eu tinha experiência, mas não quis arriscar.


Abriu uma vaga para enfermeira para atuar na área de HIV/AIDS e exigia experiência. Eu me sentia confiante após a pesquisa de iniciação científica. Prestei a prova e passei, passei em segundo lugar para uma prova que tinha apenas 1 vaga, então a vaga não era minha. Estudei sobre minha adversária e aguardei ao menos uma entrevista como dizia no edital, eu tinha uma viagem na época e a entrevista no mesmo dia e horários muito próximos. Eu tinha que fazer escolhas e fiz a escolha de ir na entrevista, minha adversária não foi e eu consegui o meu primeiro emprego.


Em Setembro de 2009, após 9 meses de formada tinha conseguido meu primeiro trabalho com a carteria assinada, como diria o meu avô. Eu não sabia o que eu esperava mas eu estava lá muito entusiasmada pelo meu trabalho enquanto enfermeira na cidade de Mauá-SP e por ser uma jovem sonhadora. Estava certa de que eu podia atuar como Enfermeira e pensar no cuidado integral dos pacientes vivendo com HIV e Aids, assossiava saúde da família. Não podia deixa minhas paixões distantes eu tinha que uni-las.


Trabalhar com a saúde das pessoas é sempre muito árduo, pessoas vivendo com HIV e AIDS, das quais damos o diagnostico o, mais difícil ainda, doença essa em que o estígma toma conta em que parece ser uma senteça de morte. Implantei o agendamenteo de consultas de Enfermagem, bombava, os pacientes marcavam consulta para passar comigo. Quando eu estava na triagem, quem não conseguia marcar consulta aproveitava a oportunidade. Eles vinham a confiança em me ter como enfermeira de alguém que tinha ouvidos para ouvir. Dia após dia eu tinha mais amor pela minha profissão e pela minha escolha.


Um dos médicos que trabalhava comigo, referendava os pacientes para uma consulta comigo, ou seja, ele reconhecia que havia um cuidado especial para com os pacientes além da doença, eu dia após dia compreendia que o enfermeiro/a é quem cuida do paciente e não da doença. Eu tinha certeza que eu não nasci para a medicina. Cada história, cada relato, cada pessoa, era desafiador. Chorei, sorri, ri, abracei, fui a velórios. Quando eu pensava que não eram aderentes eles me surpreendiam. Eles tinham a enfermeira de apoio, talvez eles se esqueceram de mim, mas eu te digo, eu nunca me esqueci de cada um deles.




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